Arquivo

Imarginal

Explosão de informação

TEXTO Olivia de Souza

01 de Janeiro de 2014

'O cão e a porca'

'O cão e a porca'

Imagem Divulgação

Praticar o desapego pode ser difícil no universo criativo das artes visuais, em que artistas, apesar de admirarem uns aos outros, optam por não interferir no trabalho alheio, seja por preciosismo, vaidade ou ciúme mesmo. No entanto, há aproximadamente dois anos, essa barreira vem sendo quebrada por dois jovens artistas pernambucanos, que têm realizado, juntos, um trabalho autoral.

Fernando Moraes e Raone Ferreira se conheceram em 2011, cursando Design Gráfico na Faculdade Aeso Barros Melo e, entre conversas com amigos e trocas de sketchbooks, perceberam referências e estilos de desenho similares. Não demorou muito até que Raone viesse com um papel tamanho industrial e convidasse Fernando para um desenho a quatro mãos, sem rascunho, direto na caneta preta. Acabaram por fundar o projeto Imarginal.


O cão e a porca (foto de abertura) e Rei da fome são parte de um projeto de 10 ilustrações feitas em papel tamanho industrial. A dupla atualmente trabalha no quinto desenho. Imagem: Divulgação

Unindo surrealismo e megalomania, com painéis e cartazes de grandes proporções que, por vezes, demoram três meses para serem finalizados, o duo utiliza técnicas de pontilhismo e tracejado para criar, com detalhe e profundidade, desenhos de criaturas imaginárias e híbridas em tons monocromáticos, com texturas e pouquíssimo (ou nenhum) uso de cores.


Fernando e Raone utilizam nanquim em desenhos que primam
pelo detalhe. Imagem: Divulgação

A dupla deslanchou depois de os primeiros trabalhos terem sido exibidos em sites conceituados, como o da revista Zupi e os portais estrangeiros Daily InspirationThis Is Colossal e Juxtapoz Magazine. O que deu origem à exposição Animal vs Deus, em abril de 2012, e, logo em seguida, o convite para participar do Festival Abril Pro Rock, ocasião em que puderam vender os produtos da Margin (linha de camisetas estampadas com desenhos da dupla), realizar um live painting durante os dias de shows, e uma oficina de desenho colaborativo. “O que acho legal, com a experiência que a gente vai ganhando, é a liberdade de um interferir no traço do outro. São dois artistas pensando juntos, interagindo entre si, finalizando o trabalho do outro. Esse desapego da obra abre muito a cabeça da gente”, afirma Raone.


Criaturas imaginárias, desenhadas a quatro mãos, resultam de um
desapego da obra. Imagem: Divulgação

TATUAGEM
A partir de 2013, Fernando e Raone investiram no universo da tatuagem, uma paixão compartilhada. Em outubro do ano passado, fizeram parte da II Mostra de Sketches de Pernambuco, realizada n'A Casa do Cachorro Preto, em Olinda, ocasião em que puderam entrar em contato com outros nomes da tatuagem pernambucana. “O trabalho do Imarginal busca muita textura, pontilhismo, rachaduras, linhas. E, na tatuagem, a gente não consegue chegar ao nível de detalhe que consegue no papel. Então, a princípio, um dos desafios era esse: poder transpor para a pele, sem esse enorme nível de detalhes, o nosso estilo”, comenta Raone.


Foto: Divulgação

No campo das artes gráficas, bebem na fonte de artistas como o norte-americano Geof Darrow (concept artist do filme Matrix), e o cearense Bruno 9li, que atualmente reside em São Paulo e que, assim como a dupla, busca criar imagens únicas, não definíveis numa escola específica. Já no campo da tatuagem, Fernando e Raone comentam o trabalho de artistas como o paulistano Gregório Marangoni e o inglês Thomas Hooper.


Por conta dos detalhes, trabalhos chegam a levar três meses para ficarem prontos.
Imagem: Divulgação

“Já existe uma escola do pontilhismo na tatuagem, da qual estamos começando a fazer parte agora, pois usamos essa técnica. Mas ela não é o que mais nos influencia na hora da criação, apesar de observarmos e admirarmos trabalhos como o de Marangoni e o de Hooper. Buscamos passar para a pele o estilo que criamos no papel”, comenta Fernando.


Com o recém-aberto Corvo Estúdio, o duo resolveu investir na tatuagem. Foto: Divulgação

Apesar de não dialogar com o estilo “imarginal”, o grafiteiro e tatuador pernambucano Paulo Victor Skaz tornou-se o primeiro e o maior contato da dupla no universo da tatuagem. Juntos, eles dividem aprendizados e o local de trabalho no recém-aberto Corvo Estúdio. Ao contrário de Fernando e Raone, Paulo usa uma apurada técnica de espirro de tinta, que faz com que os desenhos se assemelhem a verdadeiras aquarelas eternizadas na pele.


Foto: Divulgação

“Paulo é nosso contato direto com a tatuagem aqui em Pernambuco. Ele nos passa toques sobre aplicação, uso de tinta, indica novidades pra gente, e não é à toa que estamos trabalhando juntos agora. Hoje, no campo da tatuagem, é possível ver muita gente com um trabalho mais autoral, sem copiar as escolas consagradas, como a oriental, a oldschool, a newschool. Lógico, são artistas que as usam como referências, mas você vê que essas pessoas estão tentando imprimir um estilo próprio. Acho que a tendência é essa”, opina Fernando. 

OLIVIA DE SOUZA, editora da Continente Online.

Publicidade

veja também

Polytheama: O cinema à espera de espetáculos

Lanzarote: A ilha de Saramago

Jean-Louis Comolli: Os limites do visível