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Anabella López

A imagem lúdica

TEXTO Marina Moura

01 de Janeiro de 2016

Ilustração 'Bicho não' faz parte da série de cinco livros escritos por Alessandra Pontes Roscoe

Ilustração 'Bicho não' faz parte da série de cinco livros escritos por Alessandra Pontes Roscoe

Imagem Divulgação

“Considero que cada ser humano tem todas as idades dentro dele. Não faço diferenciação entre uma criança e um adulto.” A declaração da ilustradora argentina Anabella López, além de nos nortear acerca de sua poética, coincide com a mudança de perspectiva que se tem dado à ilustração infantil no século 21. Se, antes, a palavra era soberana em relação à imagem, cuja função se mostrava meramente ornamental, atualmente, essa perspectiva tem mudado, e o que se tem visto são livros infantojuvenis cada vez mais sofisticados em termos imagéticos e narrativos. Em consonância com esse panorama, a artista lança mão de ilustrações não para facilitar ou explicar o que quer que seja aos pequenos leitores. Valorizando as sutilezas do cotidiano, a natureza e as tradições, os desenhos de Anabella propõem narrativas abertas que estimulam o imaginário.


Anabella adaptou o clássico infantil Barbazul, de Charles Perrault, a ser lançado pela Aletria Editora. Imagem: Divulgação

A ilustradora nasceu na capital argentina em 1984, onde se formou em Design Gráfico pela Universidade de Buenos Aires. Atualmente, mora em Porto de Galinhas e dedica-se a escrever e ilustrar livros infantis, além de participar de mostras e ministrar oficinas. Já teve seus trabalhos divulgados na exposição Le immagini della fantasia, em 2011, na Itália; e na Mostra Internacional de Sharjah, nos Emirados Árabes, em 2013. Participou ainda de mostras coletivas no Recife, em Olinda, Salvador e Buenos Aires. Tem mais de 20 títulos publicados ao longo da carreira, com traduções no México, Estados Unidos, Canadá e Portugal.


Livro Capitão Barbante, de autoria partilhada com Henrique de Almeida Barbosa ganhou o Prêmio Alfredo Fernandes de Literatura Infantil (Manaus, 2014). Imagem: Divulgação

Anabella faz parte da geração de autores/ilustradores que se utilizam de técnicas manuais e digitais para expandir possibilidades e criar diálogos com os leitores. “Quando se produz imagens mudando a técnica ou linguagem, isso ajuda a produzir conteúdos diferentes. Cada técnica possui um tom de voz diferente, que o autor pode combinar ou não para contar uma determinada história”, explica. Se é flexível no seu processo criativo, um fator caro à artista portenha e recorrente em seu trabalho é a valorização do lúdico. “Brinco, quando converso, quando dou aulas, brinco para conseguir uma imagem… A possibilidade de brincar é o que nos permite ascender a outros mundos.” Ela rechaça, inclusive, ideias associadas à seriedade e metodologia profissional. “Se você diz, por exemplo, que fez uma ilustração em 15 minutos e outra em três dias, todo mundo vai achar que a que demorou mais é melhor. Atribui-se muito valor ao tempo e ao esforço, mas, no universo da arte, a lógica é outra”, defende.


Em De parcerias e trapaças, Maria Inez do Espírito Santo reconta histórias de povos indígenas sobre animais da floresta. Imagem: Divulgação

A maioria das ilustrações de Anabella possui cores vibrantes e saturadas, característica que ela acredita ser mais brasileira que argentina. “Na Argentina, a paleta tende a ser mais monocromática, com tons mais neutros e cinza”, observa. Sobre as semelhanças entre os países, a artista aponta o elogio das raízes culturais nas obras infantojuvenis. Segundo ela, outro ponto que aproxima as nações é o entendimento de que, em um livro ilustrado, a autoria é compartilhada. A despeito das variações que ocorrem, a depender da editora e das partes envolvidas no processo, a coautoria é mais um sintoma da mudança da perspectiva que dá peso maior à palavra sobre a imagem. “Todo ilustrador é também autor. Palavras e imagens contam juntas uma história.” No caso de A força da palmeira (Pallas Mini, 2014), livro pelo qual ganhou o Prêmio Jabuti 2015 na categoria Ilustração de Livro Infantil ou Juvenil, Anabella adaptou o enredo de um conto oral africano, ilustrou, diagramou e criou o projeto gráfico.


Com texto de Naná Martins, Iyá Agbá adapta para o universo infantil as tradições do candomblé. Imagem: Divulgação

Para 2016, a ilustradora planeja lançar duas obras de autoria integral: Barbazul, uma adaptação do clássico infantil de Charles Perrault, já publicado na Argentina; e Um coelho, ambos pela Aletria Editora. Ela está também trabalhando em um livro-imagem, que dispensa a linguagem verbal e eleva à máxima potência a materialidade do livro e suas técnicas de feitura. Adepta de um procedimento criativo pessoal e sensível, Anabella acredita que “o artista demora uma vida para criar imagens, pois elas são produto de todas as experiências que ele já teve”. 

MARINA MOURA, estudante de Jornalismo e estagiária da Continente.

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