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'Candeeiros e neons' junta-se à “prole” de Xico Bizerra

Compositor que nunca interpreta as próprias músicas chega ao nono disco da série 'Forroboxote', uma espécie de franquia musical de sucesso, com a voz de diversos cantores

TEXTO Thiago Lins

01 de Junho de 2011

Xico Bezerra

Xico Bezerra

Foto Divulgação

Hoje, Forroboxote é uma marca bem-sucedida. Em 2002, era a estreia arriscada – em álbuns temáticos – de um tal de Xico Bizerra, funcionário público em vias de se aposentar. Depois de trocar o balcão pela música de raiz, Xico começou a soar ousado, ainda mais por não cantar. Por se considerar desafinado, convidou os amigos cantadores Nico de Pádua e Serginho Luiz para assumirem a tarefa.

Entre parcerias e regravações, Pádua e Luiz são dois dos primeiros nomes da extensa lista do “selo” Forroboxote: Alcymar Monteiro, Chiquinha Gonzaga, Quinteto Violado, Dominguinhos, Maciel Melo... Todos regravaram ou tocaram com Xico numa determinada altura da sua prolífica carreira. Apesar de ter se lançado tarde, Xico vem gravando praticamente um CD por ano, desde então. O mais recente, Candeeiros e neons, a propósito do nome, vai “do tradicional ao moderno, do simples ao sofisticado”, conforme atesta o próprio autor.

O nono volume chega depois de Xico já ter sido gravado por 230 vozes diferentes. Sozinha, Se tu quiser, sua música mais gravada (do Forroboxote 2, de 2003), soma 126 interpretações, algumas feitas por medalhões como o caboclo sonhador Maciel Melo e Xangai. Candeeiros e neons, apesar de ser esteticamente mais amplo do que os discos anteriores, foi composto à velha maneira de Xico: intuitivamente, “sem receita”, a partir de seu teclado. Dali partiu para 200 horas em estúdio, num processo que envolveu 58 pessoas, divididas entre instrumentistas, técnicos, produtores e daí em diante.

Mais uma vez, Xico é “cantado” por terceiros: Maciel Melo, Silvério Pessoa e até Zé Brown (o rapper que virou repentista) engordam o time de Candeeiros e neons. O destaque entre as parcerias fica para o Quinteto Violado, que arranjou a faixa Olinda, Holanda: Xico dedica o CD ao saudoso fundador do grupo, Toinho Alves. O baixista, que morreu em 2008, aos 64 anos, é o autor da música que o Quinteto interpreta nesse disco. Olinda, Holanda é uma das melhores faixas do volume.

O álbum ainda traz uma parceria póstuma com Luiz Gonzaga. Ocorreu de Xico ser convocado para participar de um projeto idealizado pelo compositor baiano Gereba, que convidou diversos compositores (de Caetano Veloso a Zeca Baleiro) a escreverem para músicas instrumentais do velho Lua. Xico letrou Pise de mansinho, que data de 1942: “Seja bem-vinda/ Chegue, pise de mansinho/ Bote carinho nesse teu belo pisar/ Tenha cuidado pra não deixar magoado/ Um peito cansado de apanhar”, diz a letra de Xico. Outro ponto alto do disco, Pise de mansinho conta com um vocal inspirado do conterrâneo Santanna (Xico é cearense radicado em Pernambuco) e arranjo preciso de Bozó.

Para divulgar seu novo trabalho, Xico conta com os parceiros já mencionados, que usam o poder de suas vozes para isso. O compositor costuma dizer que nem a mulher dele compraria seus discos, caso ele cantasse. É assim, calado, que hoje Xico contabiliza 350 músicas gravadas, que chegam a quase 700, se somadas às regravações. Façanhas que o levaram a se tornar verbete no estimado Dicionário Cravo Albin da MPB.

É com saldo positivo que o artista admite encerrar a numerosa série. “É complicado chamar o povo para cantar, e o formato está exaurido”, explica. Mais fácil deve ter sido improvisar com Dominguinhos, o que se deu recentemente. Tudo começou com Elba Ramalho encomendando um forró ao sanfoneiro. Este pediu uma letra a Xico, com quem se reuniu para improvisar no Recife. Dominguinhos, que tira melodias da sanfona com a mesma fluidez que os cantadores improvisam versos, provavelmente nem se deu conta de que Xico, meio atento e meio impressionado, estava gravando tudo.

Os dois, que tinham se encontrado para fazer uma música para Elba Ramalho, deixaram o estúdio com 11 melodias inéditas, que viraram um “presente” do sanfoneiro para Xico, desde que o último se comprometesse a letrar as músicas. Xico sabe que, dessa vez, escrever não vai ser tão fácil quanto tocar, dada a responsabilidade de firmar parceria com o sanfoneiro, visto como um gênio. 

THIAGO LINS, repórter especial da revista Continente.

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