Adeus à inesquecível Ilva Niño
Atriz pernambucana faleceu, nesta quarta-feira (12), aos 90 anos, deixando papéis marcantes no teatro, no cinema e na TV
TEXTO Revista Continente
12 de Junho de 2024
Ilva Niño como Dona Epifânia, na novela 'Cheias de Charme' (2012), da TV Globo
FOTO Estevam Avellar/TV Globo
Há muitos protagonistas antológicos na história da TV brasileira. Mas, mesmo sem ter feito um papel principal em produções televisivas, a atriz Ilva Niño, que faleceu nesta quarta-feira (12), aos 90 anos, deixou seu nome na história da dramaturgia brasileira. Mais conhecida por seu papel, na novela Roque Santeiro (1985), como a empregada da Viúva Porcina (Regina Duarte), cujo chamado, “Miiinaaa!”, popularizou o bordão entre os telespectadores, a atriz pernambucana teve uma trajetória marcante.
Nascida em Floresta, sertão pernambucano, em 15 de novembro de 1933, Ilva Niño começou a se interessar pelas Artes Cênicas ainda na juventude, ao participar de um curso de teatro grego ministrado por Ariano Suassuna, seu professor no Colégio Estadual de Pernambuco. "Ilva Niño é essencialmente uma mulher do teatro. Ela ficou muito conhecida como a empregada Mina da Viúva Porcina, na novela Roque Santeiro, mas, muito antes disso, dessa consagração nacional, ela já era reverenciada pelo teatro brasileiro", analisa Leidson Ferraz, pesquisador e autor de livros sobre a história do teatro, em entrevista à Continente.
Segundo Ferraz, no início Ilva Niño usava o pseudônimo Nina Elva, para esconder da família que estava se dedicando ao teatro. Nesse período, ela participou de várias produções. "Em 1954, a atriz integrou o elenco da peça Antígona, com direção de Ariano Suassuna. Em 1955, ela fez a Comédia da Panela, de Plauto, com direção de Ariano. E Ilva funda, com colegas, inclusive Luiz Mendonça, que vai ser o companheiro de vida dela, o Teatro Adolescente do Recife".
O grupo teatral montou Terra Queimada, de Aristóteles Soares, O Casamento Suspeitoso, de Ariano Suassuna, e também a primeira versão de A Compadecida, como se chamava inicialmente Auto da Compadecida. "E Ilva vai para o Rio de Janeiro com esse elenco, ganha como medalha de ouro, como melhor espetáculo [da Associação Brasileira de Críticos Teatrais] e Ariano passa a ser conhecido mundialmente por conta da projeção da imprensa do Rio e São Paulo. Então Ilva esteve em montagens muito impactantes do teatro brasileiro", ressalta Ferraz.
Iniciou sua carreira artística no Movimento de Cultura Popular na década de 1960. Após o golpe de 1964, Ilva e seu marido, o diretor teatral Luiz Mendonça, mudaram-se para o Rio de Janeiro, onde continuou a atuar em diversas peças, como O Berço do Herói e O Pagador de Promessas, de Dias Gomes. "Ilva também, junto a Luiz Mendonça, participou do Movimento de Cultura Popular. Ela foi integrante do Teatro de Cultura Popular, o TCP, com montagens muito importantes, um grupo que foi dissolvido pela ditadura civil-militar. Então era uma mulher, além de ser uma mulher apaixonada pelo teatro, era uma mulher guerreira, que tinha uma atitude política na vida. Ela saiu fugida do Recife, quando estourou a ditadura e foi se esconder no Rio de Janeiro, e a vida dela passa a ser lá, com o marido, Luiz Mendonça", continua Ferraz.
A carreira de Ilva Niño abrange mais de 30 novelas, 20 filmes e mais de 30 peças teatrais. Dentre seus trabalhos mais notáveis na TV estão Gabriela (1975), Pecado Capital (1975) e Roque Santeiro (1985). Na década de 1980, consolidou-se como uma das artistas mais conhecidas do país, atuando em novelas como Água Viva (1980) e Bebê a Bordo (1988). Ilva também participou da primeira minissérie da TV Globo, Lampião e Maria Bonita (1982), onde interpretou a mãe de Maria Bonita.
Em 2016, Ilva Niño promoveu a reabertura do Teatro Niño de Artes Luiz Mendonça, no Rio de Janeiro, em homenagem ao marido, que faleceu em 1995. Este espaço tornou-se um símbolo de sua dedicação às Artes Cênicas. Em 2017, ela subiu ao palco do Teatro Luiz Mendonça, no Recife, com a peça Cabaré da Humanidade, no qual resgata o teatro de revista e exaltou a memória do filho, Luiz Carlos Niño (1965 - 2005).
"Ilva é um exemplo. Cúmplice-se a vida inteira de Tio Lourinho [Luiz Mendonça], cúmplice pelo amor pelo teatro, por entender a importância da arte e da política na transformação do mundo, entender o compromisso do artista como um cidadão político e um cidadão de mudança social", afirma André Brasileiro, ator e produtor, sobrinho de Luiz Mendonça. "Imagina, nos anos 1960, se firmar no Rio como artista. Junto a Luiz Mendonça e José Wilker, e toda uma geração importante para a cultura nacional, importante para Pernambuco. Artistas que saíram daqui e que entenderam o compromisso que começou ali no Movimento de Cultura Popular. Então, ela é um exemplo de mulher. Noventa anos trabalhando pela arte brasileira".
Assista abaixo ao documentário Ilva: