Memória

O centenário do primeiro rei do brega

Cantor e compositor pernambucano Orlando Dias, conhecido por 'Tenho ciúme de tudo', vendeu cerca de 6 milhões de discos

TEXTO Revista Continente

01 de Agosto de 2023

O cantor Orlando Dias em 1957

O cantor Orlando Dias em 1957

Foto Divulgação

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Depois que o brega se tornou cult, passou a influenciar diversos artistas nacionais. Em Pernambuco, por exemplo, essa influência pode ser percebida na música de compositores de diversas gerações, como Otto, Siba, Johnny Hooker e Jáder. Mas houve uma época em que o gênero musical era alvo de muito preconceito, mesmo tendo sucesso comercial avassalador (ou talvez por isso mesmo), e só era feito por quem tivesse coragem de enfrentar ou de ignorar as críticas.

Da primeira leva de cantores ligados ao estilo musical, um nome que se destacou foi o de Orlando Dias. Influenciado por um outro Orlando, o Silva, o cantor das multidões, Dias começou a cantar ainda criança. Iniciou, aos 11 anos, no conjunto vocal A Turma dos Onze. E despontou na juventude, numa época em que os artistas precisavam participar de concursos radiofônicos – e deveriam ter o que se chamava de "gogó" ou vozeirão. Em 1940, com apenas 17 anos, apresentou-se na Rádio Clube de Pernambuco, ao lado do grupo Anjos Rebeldes, conquistando o primeiro lugar de uma competição musical. Ganhou, com isso, um contrato como cantor da emissora, onde permaneceu por 10 anos.

Orlando interpretou vários gêneros, inclusive samba. Mas foi com a chamada “música romântica” que ele se destacou dentre os seus contemporâneos. Na década de 1950, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde consolidou uma carreira de cantor, tornando-se o primeiro "Rei do Brega" do país – ao todo, foram cerca de 6 milhões de discos vendidos.

Para isso, foi fundamental a escolha das músicas, algumas se tornaram sucesso, sendo o maior deles, Tenho ciúme de tudo (Waldir Machado). Também cantou sobre o mesmo tema no disco O inimitável, em que interpretou Ciúme de você (Luiz Ayrão), cinco antes de Roberto Carlos gravá-la e de lançar o famoso álbum com o mesmo título, em 1968. 

A partir daquele ano, as gravações de Orlando Dias não conseguiam mais atingir a mesma repercussão comercial das anteriores, talvez pelo impacto do estrondoso sucesso de Roberto Carlos e de outros cantores do brega, como Reginaldo Rossi. O último sucesso nacional de Dias foi Com pedra na mão (parceria com Maury Câmara).

Nascido José Adauto Michiles, na terra do frevo (é tio de J.Michiles), do maracatu e também do brega, Orlando Dias foi perdendo popularidade para o cantor de Garçom. Isso fez ofuscar seu nome como o primeiro grande sucesso da onda brega, que se formou originalmente na passagem da década de 1940 para 1950, com influência de canções italianas e do bolero, e na década seguinte, da Jovem Guarda, que, por sua vez, bebia da fonte da primeira fase (iê-iê-iê) dos Beatles.

Já longe dos holofotes, o artista faleceu em 2001, vítima de um infarto, aos 78 anos. Antes, seu coração intenso contribuiu para performances emotivas, em que se destacavam gestos teatrais para atiçar a reação da plateia – costumava ajoelhar-se no chão, rasgar o paletó e até chorar. E tinha sempre à disposição lenços para enxugar as lágrimas – reais ou não. Se estivesse vivo, neste 1º de agosto de 2023, Orlando Dias completaria 100 anos, assistindo ao triunfo do estilo que ajudou a formatar e a popularizar.

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